O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), anunciou na noite desta quarta-feira que vai abrir o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. O pedido, feito pelos juristas Miguel Reale Júnior, Hélio Bicudo, Janaína Paschoal e Flávio Costa, foi protocolado por líderes da oposição em outubro. O documento baseia-se nas pedaladas fiscais, que, segundo o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), se repetiram em 2015. Cunha descartou que a medida seja uma retaliação e afirmou que a decisão é de “natureza técnica”. Em breve pronunciamento no Palácio do Planalto nesta noite, Dilma disse que reagiu com “indignação” ao pedido e, sem citar o nome de Cunha, afirmou que não possui “conta no exterior”.
— Quanto ao pedido formulado pelo doutor Hélio Bicudo e advogados que o acompanham, contra esse proferi a decisão com o acolhimento da denúncia. São 22 páginas de parecer levados à publicação hoje, trata-se da argumentação de 2014, porém, a argumentação para o ano de 2015 traz a edição de decretos sem número no montante de R$ 2,5 bilhões que foram editados em descumprimento à lei orçamentária — afirmou Cunha. — Não faço isso por motivação política e rejeitaria (o pedido) se estivesse em desacordo com a lei. É uma decisão de muita reflexão e dificuldade. Nunca na história de um mandato houve tantos pedidos de impeachment. Não tenho nenhuma felicidade no ato que estou praticando.
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Dizendo-se descontente com a decisão que acabava de tomar, o presidente da Câmara começou sua fala lembrando que, durante os dez meses em que está à frente da presidência, foi cobrado inúmeras vezes para que se posicionasse a respeito dos 34 pedidos de impeachment que chegaram a suas mãos. Cunha já havia rejeitado 27 deles, e hoje acatou um e rejeitou outros quatro. Ainda há dois pedidos pendentes de análise. Cunha disse que, por, na sua opinião, Dilma ter cometido crime de responsabilidade, a aprovação do projeto de lei que muda a meta fiscal de 2015 — ocorrida em sessão do Congresso Nacional nesta tarde — não corrige a irregularidade cometida. No texto da nova meta fiscal, o governo incluiu na conta as chamadas pedaladas.
— Mesmo o PLN5 aprovado e sancionado, não supre a irregularidade de ter sido editada a norma em afronta à lei orçamentária. O embasamento disso é única e exclusivamente de natureza técnica. O juízo do presidente da Câmara é unica e exclusivamente de autorizar a abertura, e não de proferir o juízo de mérito, que será a comissão especial que irá fazê-lo, que poderá acolher ou rejeitá-lo. E o processo seguirá o seu curso — afirmou Cunha.
Para aliados, mudança do PT influenciou
A opção de Cunha de abrir o processo de impeachment levou em conta, segundo aliados, o posicionamento do PT durante o dia. Aliados de Cunha afirmaram que o presidente da Câmara se sentiu enganado, uma vez que, pela manhã, o Palácio do Planalto havia acenado que o PT estaria unido a ele. À tarde, no entanto, os representantes do partido no Conselho de Ética afirmaram que votariam pela admissibilidade do processo contra Cunha dentro do Conselho.
O presidente da Câmara vai constituir uma comissão especial para avaliar o impeachment. Cunha também vai estudar a possibilidade de suspender o recesso parlamentar apenas para que a comissão funcione.
Aliados de Cunha também disseram que estão convictos de que, com a ação do presidente, ele vai reverter os votos do PSDB e do DEM no Conselho de Ética. O PSDB tem uma reunião de emergência marcada para esta quarta-feira para falar sobre o assunto.
A reação no PT foi imediata. O deputado Wadih Damous (PT-RJ) afirmou que vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão de Cunha. Segundo ele, o presidente da Câmara desrespeitou o rito definido para estes casos. No plenário da Câmara, a atitude foi classificada como “revanchismo” e “golpe”. No Twitter, o presidente da sigla, Rui Falcão, afirmou: “Golpistas não passarão. Não vai ter golpe. Dilma fica”.
O jurista MIguel Reale Júnior, um dos autores do pedido, disse que Cunha “escreve certo por linhas tortas” e que sempre usou o impeachment como “instrumento de barganha”. Já os líderes da oposição comemoraram a decisão do presidente da Câmara.
Regimento define impeachment
O Artigo 218 do Regimento Interno da Câmara define os passos do processo de impeachment:
– Do recebimento da denúncia será notificado o denunciado para manifestar-se, querendo, no prazo de dez sessões.
– A Comissão Especial se reunirá dentro de quarenta e oito horas e, depois de eleger seu Presidente e Relator, emitirá parecer em cinco sessões contadas do oferecimento da manifestação do acusado ou do término do prazo previsto no parágrafo anterior, concluindo pelo deferimento ou indeferimento do pedido de autorização.
– O parecer da Comissão Especial será lido no expediente da Câmara dos Deputados e publicado na íntegra, juntamente com a denúncia, no Diário da Câmara dos Deputados e avulsos.
– Decorridas quarenta e oito horas da publicação do parecer da Comissão Especial, será o mesmo incluído na Ordem do Dia da sessão seguinte.
– Encerrada a discussão do parecer, será o mesmo submetido a votação nominal, pelo processo de chamada dos Deputados.
– Será admitida a instauração do processo contra o denunciado se obtidos dois terços dos votos dos membros da Casa, comunicada a decisão ao Presidente do Senado Federal dentro de duas sessões.
Do O Globo